sexta-feira, 23 de abril de 2010

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Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos morte,violar-nos,
tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo.
Entre nós e as palavras há perfis ardentes,
espaços cheios de gente de costas,
altas flores venenosas,portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício.

Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição.
Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsenor.
E há palavras nocturnas palavras gemidos,
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita

Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar

Mário Cesariny

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